O psiquiatra
e psicanalista Ronis Magdaleno Junior alerta para a importância do
acompanhamento psicológico no pré e pós-operatório de mulheres que se submetem
à cirurgia bariátrica – ou cirurgia de redução de estômago, como é popularmente
conhecida. Para ele, há o risco de que a paciente volte a engordar ou
apresentar complicações psicológicas importantes, decorrentes de vários
fatores identificados em estudo apresentado na Faculdade de Ciências Médicas
(FCM). Neste sentido, o psiquiatra indica a necessidade de a equipe de saúde
estar instrumentalizada para compreender e atuar de modo eficiente junto ao
paciente.
Ronis
Magdaleno foi orientado pelo professor Egberto Ribeiro Turato, do Departamento
de Psicologia Médica e Psiquiatria. Para fundamentar a pesquisa, ele
entrevistou sete mulheres que passaram pelo procedimento no Ambulatório de
Cirurgia Bariátrica do Hospital das Clínicas da Unicamp. Seu objetivo foi
investigar as vivências emocionais destas pacientes, bem como as profundas
modificações físicas e psicossociais pelas quais passaram.
A
cirurgia bariátrica é indicada no tratamento da obesidade mórbida,
principalmente quando existem doenças já instaladas no organismo. A busca pelo
procedimento tem crescido de modo expressivo nos últimos anos, visto que os
resultados são significativamente melhores do que outras terapêuticas
conservadoras. A melhora nas condições de saúde para os portadores de diabetes,
hipertensão, doenças cardiovasculares e problemas osteoarticulares são exemplos
de resultados positivos da cirurgia. No entanto, demais aspectos psicossociais
como, por exemplo, a melhora da autoestima e experiências de reinserção
social, têm um forte impacto como motivação para a decisão pela cirurgia.
“O
obeso é, muitas vezes, discriminado e sofre com a inadequação social por conta
de um apelo estético muito forte na sociedade contemporânea. Por isso, a
crescente procura por tratamentos que minimizem ou eliminem esta condição”,
destaca o psiquiatra.
No
estudo, foi identificada uma série de questões delicadas e complexas relacionadas
a novos conflitos experimentados pelas mulheres após o emagrecimento
proporcionado pela cirurgia. Segundo ele, algumas mulheres apresentam
expectativas irreais, chegando a acreditar que o procedimento e o consequente
emagrecimento serão a solução para os mais diversos problemas de suas vidas.
Imaginam, por exemplo, resolver conflitos emocionais e conjugais ou até mesmo
relativos à imagem corporal. Também acreditam na melhora da timidez e, nestes
casos, o risco de desilusão com a cirurgia e seus resultados é muito grande, o
que pode levar a uma desmotivação em manter o desafio de manter a perda de
peso.
Outra
questão apontada pelo pesquisador diz respeito às alterações do impulso
alimentar e da fome. Sabidamente, o paciente portador de obesidade mórbida
apresenta problemas relacionados ao controle do impulso alimentar, muitas
vezes utilizando o alimento como tentativa de resolver angústias de outra
natureza. Após a cirurgia bariátrica, esta via é impedida de modo significativo
pela diminuição da capacidade volumétrica do estômago, sendo a sensação de
saciedade experimentada rapidamente, mas não a satisfação alimentar.
Se
este aspecto não for adequadamente trabalhado do ponto de vista psicológico, o
paciente pode desenvolver outras estratégias para preencher este vazio ou
insatisfação, criando mecanismos compensatórios que podem resultar em desvios
da compulsão alimentar para outras vias, como o alcoolismo, por exemplo. Outra
destas vias seria a busca de alimentos altamente calóricos, de fácil passagem
pelo estômago diminuído pela cirurgia, ingeridos em pequenas quantidades e
continuamente durante o dia. Deste modo, mesmo sem ingerir grandes quantidades
de alimentos por vez, o insumo calórico é muito alto, resultando em aumento de
peso.
Algo
que também chamou a atenção do psiquiatra foi o sentimento de desproteção que
as mulheres apresentam após o emagrecimento. Ao se sentirem olhadas e admiradas
pelos homens e por outras mulheres, sentem-se expostas, o que faz recrudescer
conflitos relacionados à sexualidade. Os sentimentos de inveja, ciúme e
competição – que estavam encobertos pela obesidade – passam a ser comuns, o
que as expõe a situações novas com as quais não estão, muitas vezes, aptas a
lidar.
O
cuidado psicológico é uma regra no Ambulatório de Cirurgia Bariátrica do HC da
Unicamp, assim como a preocupação em oferecer acompanhamento pré e
pós-operatório por uma equipe multidisciplinar. O preparo para a cirurgia é
longo e inclui a perda de peso antes do procedimento, o que diminui muito os
riscos no pré e pós-operatórios. Estes aspectos acabam por selecionar
candidatos com motivações realísticas relacionadas à cirurgia.
A
realidade, porém, não é uma regra fora do âmbito universitário. Para o
pesquisador, somente a cirurgia não é suficiente para um bom prognóstico e uma
perda de peso sustentada ao longo dos anos, sendo fundamental o acompanhamento
psicológico antes e depois da cirurgia por profissionais habilitados